terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A culpa seria de Deus ?



A culpa é de Deus!

Por Marcelo Carneiro da Cunha

Só pode ser.

Eu olhei com atenção a imprensa, enquanto a minha querida São Paulo afunda. Enquanto pessoas sofrem o diabo, automóveis e nossa normalidade submergem, parece que ninguém pode ser responsabilizado por nada. Pela falta de construção de novos piscinões, pela falta de limpeza. Pelas novas faixas na Marginal Tietê, que podem ter reduzido a absorção de água que acaba chegando ao rio.
Ninguém tem responsabilidade. Governo do estado, há 16 anos no comando da operação, cuidando de um rio que insiste em permanecer poluído, contaminado, reprimido, recebendo 700 toneladas de esgoto por dia.
Prefeitura municipal, que parece ser mais equipada para operações de visibilidade e que não envolvam muito planejamento ou envolvimento com a cidadania.
Busquei e li, ouvi, assisti. Vi as tevês abertas fazendo o show de sempre, os canais de noticias analisando as conseqüências, muito mais do que as causas, como sempre que o dirigente é do PSDB, parece.
O prefeito Kassab pode estar mais ocupado com a inauguração da árvore de Natal e distribuição de panetones, porque não está no meio da bufunfa, com lama até o pescoço - dessa vez de maneira literal -, dirigindo a cidade parada no alagamento.
Portanto, se a responsabilidade não pode ser ligada a nenhum ser humano, entre os que foram eleitos para serem os responsáveis por planejar, executar e gerenciar as obr as que tornam uma cidade viável, então de quem ela pode ser?
Claro que nesse ano vivemos o El Niño, que aquece as águas do Pacífico e, de alguma maneira, trazem essa água pra cima da gente. Se o El Niño acontece de vez em quando, quem está por traz disso só pode ser Deus, esse grande responsável por tudo que acontece no universo, inclusive a inapetência de prefeitos e governadores por soluções que solucionem o que o divino faz cair em cima dos humanos com alguma e previsível regularidade.
Portanto, paulistanos, vamos todos até a igreja mais próxima, cujas portas estejam abertas e os acessos desobstruídos.
Façamos a nossa parte, que é o que nos resta fazer, enquanto prefeitos e governadores deixam pra lá as suas.
Oremos ao Senhor, pra ver se ele alivia a mão e a gente chega em casa.
E aproveitemos para pedir a Ele que dê uma olhada para os morros e demais zonas de risco da cidade, já que elas existem, todos sabem onde ficam, mas não vão até lá para remover os mais despossuídos de seus barracos antes que eles, inevitavelmente, desabem.
Se Deus não zelar por eles, se os órgãos públicos se omitirem, o que iremos ver é o que já estamos vendo, e que é pior do que tudo mais, e se traduz em vidas humanas perdidas no que jamais deveria ter tais conseqüências.
Uma cidade é importante demais para ser tratada assim.
Pessoas são ainda mais importantes, e merecem ser o centro de tudo que se faz.
Portanto, que tal a prefeitura se mexer e fazer, antes que seja ainda mais tarde demais?
Amém.


Quem é Marcelo Carneiro da Cunha

É escritor e jornalista. Participa do conselho editorial do MPost. Escreveu o argumento do curta-metragem "O Branco", premiado em Berlim e outros importantes festivais. Entre outros, publicou o livro de contos "Simples" e o romance "O Nosso Juiz", pela editora Record. Acaba de escrever o romance "Depois do Sexo", que foi publicado em junho pela Record. Dois longas-metragens estão sendo produzidos a partir de seus romances "Insônia" e "Antes que o Mundo Acabe", publicados pela editora Projeto.

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