quarta-feira, 18 de novembro de 2009
O filme "Lula, o filho do Brasil" conta uma história real que emociona e incomoda
O filme "Lula, o filho do Brasil" estreará em 500 cinemas no dia 1º de janeiro.
As platéias chorarão de emoção e a oposição, de raiva.
São 128 minutos de viagem pela história de um garoto que sai do sertão pernambucano, come o pão que o Diabo amassou, e chega à presidencia da República.
É possível que algumas pessoas comecem a chorar já na fila para a compra de ingressos.
Deliberadamente épico, o filme arranca até a última lágrima da platéia.
A epopéia foi lustrada pelos roteiristas e pelo diretor Fábio Barreto, mas não foi invenção deles.
Ela está na essencia da história do filho de Dona Lindu.
"O Filho do Brasil" baseia-se no livro do mesmo título, de Denise Paraná, lançado em 2002.
Ele reúne uma longo depoimento de Lula à autora, mais entrevistas com seus três irmãos, três irmãs e a mulher, Marisa.
Quem o leu viu uma parte da alma de Nosso Guia, acompanhou as vicissitudes de sua família e admirou a altivez das irmãs Marinete, Maria e Tiana, duas empregadas domésticas e uma operária.
A crítica a "Lula, Filho, do Brasil" correrá em duas pistas.
Uma, estética, discutirá o filme.
Outra, política, cuidará da narrativa e seus efeitos num ano de eleição presidencial.
Só Deus sabe o tamanho do benefício que o sucesso do filme levará aos companheiros. Olhado sob esse prisma, é um exemplar de realismo petista.
Retrata com fidelidade quase todos os fatos que conta, mas constrói um herói implausível, sem defeito nem deslize.
Pena, porque aos 29 anos, Lula abandonou uma companheira grávida de seis meses com quem planejava viver.
Foi o caso de Miriam Cordeiro, mãe de Lurian. (Essa história está bem contada, por ele, no depoimento que deu ao projeto "ABC de Luta": "Eu até compreendo o ódio que [ela] tem de mim").
Situações desse tipo refletem a complexidade, as tensões e os sofrimentos da vida dos mortais.
Tirá-las da narrativa, como fizeram, empobrece o personagem e ilude a platéia.
É comum ver adversários de Lula torcendo o nariz sempre que ele relembra as dificuldades por que sua família passou.
As desgraças mostradas no filme são uma pequena e contida amostra do que eles penaram.
Fábio Barreto não filmou a cena em que o menino Lula pede um chiclete mastigado a um amigo. Ficou de fora também a morte, sem qualquer assistência médica, de um casal de gemeos de Dona Lindu, recem-nascidos em São Paulo.
A doença e morte de Lurdes, primeira mulher de Lula, grávida de oito meses, vai mostrada em cenas breves, quase secas.
A tragédia que se vê na tela choca e emociona, mas não exagera.
Aquilo foi o que aconteceu no Hospital Modelo em 1971.
Um episódio pouco conhecido da vida de Lula foi sovieticamente alterado pela arquitetura da construção do herói implausível.
No filme um operário é assassinado durante uma greve e seus colegas atiram o empresário (ou gerente) do alto de um passadiço da fábrica.
Lula assistiu a cena de longe e, indignado, reclamou com seu irmão. Falso. Nosso Guia contou o caso a Denise Paraná e ele está na página 80 de seu livro. (Paraná é co-roteirista do filme.) O episódio ocorreu em 1962, o dono de uma pequena confecção baleou um grevista e seus colegas atiraram-no do alto de um sobrado e lincharam-no. É Lula quem narra: "O pessoal chutou ele" (à) "Acho que ele morreu" (à) "Eu achava que o pessoal estava fazendo justiça".
"Lula, o filho do Brasil" ajudará, e muito, as campanhas de Dilma Rousseff e do PT. Se Luís Inácio da Silva visse esse filme em 1968, quando era um peão que só pensava em futebol, votaria no PT, em Dilma e nos candidatos indicados por aquele filho porreta de Dona Lindu.
Nenhum dos ingredientes que o levariam a tomar essa decisão seria inteiramente falso.
Noves fora a trapaça do linchamento e alguns retoques, o que aparece na tela aconteceu na vida real.
Como Tarzan, Rocky Balboa ou até mesmo o esplendido Napoleão de Abel Gance, o herói implausível de "Lula, o filho do Brasil", encanta, comove, e só.
Torce-se por ele, mais nada. Saudades de Erin Brokovich (Julia Roberts) e de George Patton (George C. Scott), filmes que enriquecem quem os vê.
Elio Gaspari
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